segunda-feira, março 31, 2014

DESERTASTE … E VENS AGORA FAZER DOS PORTUGUESES IMBECIS

10172795_796892143672662_1823030382_nJá não chega um governo, uma maioria e um presidente. Durão quer alongar mais a tríade. Quer um outro governo, uma outra maioria e um outro presidente. Uma trilogia mais alargada, mais funcional e, sobretudo, mais despolitizada. Quer, com o sémen ordoliberal, dar à luz um consenso que descarte o valor do dissenso e o poder constituinte do conflito. Durão quer, no fundo, uma democracia sem substância, uma democracia onde a política se torne dispensável e o direito constitucional intolerável. Uma tríade à altura da austeridade e da agiotagem dos seus propósitos.

quarta-feira, março 26, 2014

O CÍNICO E INDECOROSO CRITÉRIO DE EQUIDADE

  • ASSENTE NO EMPOBRECIMENTO PROGRESSIVO E GENERALIZADO DAS REFORMAS
  • FUNDADO NUM EVOLUTIVO E DEBILITANTE QUADRO ECONÓMICO E SOCIAL
  • QUE SE CUMPRE ATRAVÉS DE UM AJUSTAMENTO COM BASE NA REDUÇÃO DE PENSÕES
  • E NEGLIGENCIA A FUNÇÃO SOCIAL DOS SISTEMAS DE REFORMAS NA FORMULAÇÃO DAS SUAS POLÍTICAS

 

pensoesO desenvolvimento deste tópico é o primeiro de um agrupado de textos que tem como âmago a situação dos reformados e pensionistas. Nesta perspectiva, começo por manifestar, neste escrito inaugural, o meu estado de alma, confessando o sentimento de que a vitalidade de um aposentado radica nos seus elementares e justos projetos futuros com a consciência certa de que, na ausência destes, se avizinhará, com toda certeza, a desistência intimadora de um viver naufragado na intensa e torturante percepção, diria limite, dos naturais limites da vida. Assim, nestas árduas circunstâncias do tempo atual, apenas sobrará ao idoso aposentado o angustiante sofrimento de um sobreviver sem vida, fragilizando-o ainda mais ante os acrescidos e diversos constrangimentos que inesperadamente o atormentam, como sejam os que hoje regressivamente acontecem, no plano social e económico. As políticas de austeridade, obstinada e violentamente alojadas nos rendimentos dos trabalhadores e dos aposentados, em muito têm contribuído para o revés dessa derradeira e vital vontade de pensar e experienciar expectativas futuras encorajadoras.

Para melhor introduzir este resvalar sucessivo do empobrecimento dos aposentados e enquadrar as análises e reflexões que se seguirão, neste como nos tópicos seguintes, tomo de empréstimo um trabalho do economista Pedro Carvalho, publicado em 14/2/2014 aqui , reproduzindo um conjunto de gráficos, claros e convincentes, sobre a evolução dos principais indicadores (macro)económicos, e através dos quais, de um modo simples mas expressivo, o autor nos proporciona um retrato da situação portuguesa em 2013, procurando comprovar as consequências dos impactos da integração capitalista europeia, assim como da afirmação persistente dessa perigosa ideia de austeridade, como muito bem é historiada, por Mark Blyth, no seu convincente livro sobre o assunto.

domingo, março 16, 2014

A QUEM APROVEITA A FRAGMENTAÇÃO ARDILOSA DE QUEM VIVE DO RENDIMENTO DO SEU TRABALHO?

reformados2A saída da crise económica, pela competição que gera, exige uma imediata e descautelada exploração não só dos que trabalham mas, de um modo incompassivo, também dos que fazem jus ao direito da sua justa e legítima reforma. É nesta moldura política e ideológica, onde o capital ocupa o centro e ao trabalho apenas remanesce uma inumana periferia, que o capitalismo neoliberal, aliás geográfica e desigualmente repartido, procura ganhar tempo histórico para a mesmidade de uma recuperação, provavelmente hipotética mas, como sempre, mascarada.

A generalidade dos economistas, por pedantismo formativo ou  insolência política e/ou, ainda, por mesquinhas e interesseiras vassalagens de momento, mostra-se vulgarmente empedernida aos dramas da aplicação supostamente sábia das leis internas do seu requerido e exclusivo saber. Aliás, como se sabe, onde estes procuram regularidades, ciclos e previsibilidades, outros não podem deixar de se preocuparem com a condutividade e explicação dos desconcertos humanos e sociais do alcance prático, teórico e ideológico, desses mesmos saberes.

A fragmentação ardilosa incentivada entre trabalhadores no ativo e trabalhadores reformados, entre jovens e idosos, entre pessoas que trabalham no privado e os que trabalham no público, entre algumas outras patéticas dicotomias, não são mais do que minúcias despudoradas de um epifenomenismo resultante do atual reportório das políticas que, matreira e silenciosamente, se vão acomodando. O cinismo é tal que se descobrem insustentáveis injustiças entre os que sofrem e se ignoram as distâncias que separam estes dos que deles à custa vivem.

Assim sendo, o que pode esperar, destas políticas, o Trabalho? Como se vai, com clareza, confirmando, o que se pode esperar é a redução dos seus rendimentos quer por diminuição do salário real, quer por aumento das horas de trabalho não remuneradas, quer, ainda e indiretamente, por pressão do elevado desemprego. Tudo isto num contexto socialmente desfavorável, marcado por um Estado-Providência em profunda asfixia graças ao crescimento desregulado de uma obscena e impositiva financeirização, com lucros rentistas, daí advindos, verdadeiramente ultrajantes.

Nesta circunstância, apresenta-se-me então uma decisiva questão; como manter o epílogo desta crise em aberto e não blindado aos propósitos do neoliberalismo vigente como pretendem as atuais forças políticas governamentais, nacionais e europeias? Pelo que atrás se destacou, uma coisa parece configurar-se acertada. Como condição medular, importa que a classe trabalhadora, pese embora a diversidade social dos que hoje vivem do Trabalho, não se deixe ingenuamente fragmentar e que, de um modo pragmático, embora lúcido e impetuoso, se saiba solidarizar, unir e organizar à volta do que afinal é comum na sua essencialidade. Ou seja, no dinâmico posicionamento crítico, considerar como fundamentais as referências da substantivação da democracia, da dignidade das existências e da equidade e justiça sociais. A manipulação do Capital tornar-se-ia bem mais árdua e custosa, quando não inoperante.

domingo, março 09, 2014

UM PREFÁCIO LITÚRGICO AO PENSAMENTO ÚNICO

{0}&w=171&h=114&act=cropResizeOnde gira o dinheiro, daquele que se revira capital, dever-se-á hospedar a cultura da crítica, servida por um saber que edifica o lado certo da barricada. Sem pressas de vitória, interessa ocasionar e organizar forças capazes de reagirem às violências que nos controlam. Pela oposição, pela insubmissão, pela resistência, ou – quando não – pela revolta ou rebelião. A ação crítica, neste campo de refrega à dominação capitalista perversa, não pode comparecer coxa da sua ação política. Todos os meios são escassos ante a cachoeira conciliada de teses (domésticas e outras) que apoiam a perversidade do sistema na sua escandalosa mas amigável difusão mediática. O fascistoide pensamento transmitido como único, ideologicamente homótono, padroniza costumes, valoriza lugares comuns e manipula, sem pejo, o benevolente senso popular. Logo, a democracia vai-se assim trajando com uma indumentária útil para um corpo cada vez mais totalitário. Os mercados capitalizando, o povo amargando e o Cavaco enleando.

sábado, março 08, 2014

EM VÉSPERAS DE ABRIL - RELEMBRAR JORGE DE SENA

liberdade

 

CANTIGA DE ABRIL

Às Forças Armadas e ao povo de Portugal
«Não hei-de morrer sem saber qual a cor da liberdade»
J. de S.

 

 

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.


Quase, quase cinquenta anos
reinaram neste país,
a conta de tantos danos,
de tantos crimes e enganos
chegava até à raiz.


Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.


Tantos morreram sem ver
o dia do despertar!
Tantos sem poder saber
com que letras escrever
com que palavras gritar!


Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Essa paz do cemitério
toda prisão ou censura,
e o poder feito galdério,
sem limite e sem cautério,
todo embófia e sinecura.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.


Esses ricos sem vergonha,
esses pobres sem futuro,
essa emigração medonha,
e a tristeza uma peçonha
envenenando o ar puro.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Essas guerras de além-mar
gastando as armas e a gente,
esse morrer e matar
sem sinal de se acabar
por política demente.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Esse perder-se no mundo
o nome de Portugal,
essa amargura sem fundo
só miséria sem segundo,
só desespero fatal.


Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Quase, quase cinquenta anos
durou esta eternidade,
numa sombra de gusanos
e em negócios de ciganos,
entre mentira e maldade.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Saem tanques para a rua,
sai o povo logo atrás:
estala enfim altiva e nua,
com força que não recua,
a verdade mais veraz.

Qual a cor da liberdade?
É verde, verde e vermelha.

Jorge de Sena, 40 Anos de Servidão, 1979.

O DISFARCE DO INVOCATIVO DIREITO À INDIGNAÇÃO

imagesMoral, moralidade e moralismo são conceitos de raias permissíveis aquando da sua aventura mundana de inevitável particularização. Ao aliciar juízos moralizadores, a presença catalisadora da legalidade e dos costumes relaxam as fronteiras da exigente elucidação. Entre a ética que escora a moral e o moralismo que a dessubstancializa abismam-se múltiplas significâncias. Com destinações diversas, advindas de patéticas inocências ao limite da sagacidade malevolente, o campo político serve-se da bruma daí proveniente, comprazendo-se em moralizar mistificadas realidades sobre as quais ajuíza. Com a qualidade argumentativa que se lhe reconhece, José Pacheco Pereira (JPP) explora[1] o tópico, de um modo claro e fundamentado, delineando a fronteira que levou Passos Coelho a clamar indignação onde apenas mora irritação.

Tal como JPP, não me inquieta que um político esconda determinados comportamentos privados em público. Se o político A ou B engana a mulher, se tem uma filha que encobre, se é homossexual ou ainda se conserva no armário[2], são aspetos de uma natureza que, do meu ponto de vista, não constituem objeto da alçada imediata da moralidade em política. Com um sentido algo sarcástico, JPP recorda que, se assim fosse, Churchill não aguentaria um mês com tais critérios de exposição moralista, em oposição a Hitler que tinha uma vida privada sóbria e frugal. Imoralidade em política passa por outros roteiros, como lembra JPP. Roteiros feitos de mentiras, de enganos, de desprezo pelas pessoas comuns e pelo espezinhar impiedoso dos mais frágeis. Contudo, não acompanho JPP quando ele afirma; [a] acusação ao primeiro-ministro de que a sua palavra não valia nada provocou-lhe um surto de irritação mais do que indignação. Para mim, tenho que o reconhecimento deste radical juízo bateu forte, atordoou-o e a irritação despontou por clara intolerância à densidade da verdade e à firmeza da inculpação. O invocativo direito à indignação apenas se prestou a encobrir a irritabilidade de uma ocultada predisposição ao assanhamento provocada pela verdade e por esta em particular; a indesmentível verdade de que o valor da sua palavra é nenhum.


[1] “Colocar o engano no centro da política”, jornal Público, de 08Mar2014

[2] Como refere JPP no seu texto.

terça-feira, março 04, 2014

ACORDAI, CIDADÃOS!

mostra_imagem

 

A simbiose do Estado e do povo foi dissolvida. Há dois Portugais em Portugal, assim como há duas Europas na Europa. Merkel e Passos representam uma delas, certamente a mais ameaçadora. Na outra, estamos nós, os ameaçados. A contraconduta, a dissidência não são, somente, actos políticos; sobretudo, representam urgentes condutas morais”.

Baptista-Bastos

sábado, março 01, 2014

A ABSOLVIÇÃO “COMPETENTE” DA EXPLORAÇÃO

força trabalhadoresJosé Pacheco Pereira (JPP) escreve hoje (01MARÇO2014) no Público, e a dada altura, no seu texto “A Europa que nunca se debate”, forma o seguinte juízo: “Com candidatos como Rangel e Assis, que é bastante próximo de muitas posições de Rangel, o debate europeu ficará prejudicado por se fazer apenas dentro de uma ortodoxia europeísta que, do meu ponto de vista, de há muito perdeu o contacto com a realidade das nações europeias, com aquilo que é hoje a União Europeia, e com a vontade dos povos e nações da Europa”, sem que antes não se tenha coibido de acusar Rangel como “o mais europeísta de qualquer candidato europeu até agora”. De acordo com JPP, pelo que diz e escreve, Rangel mostra-se “um crítico da própria ideia de soberania e independência”, já que, ao congratular-se “com a deslocação da decisão constitucional do âmbito nacional, no caso alemão, para o Tribunal Europeu”, não deixa de implicitar a sua posição face às decisões que têm vindo a ser tomadas pelo Tribunal Constitucional português.

Não obstante a descoincidência na estética, o discurso de Rangel não só se associa como substancia a prédica do seu governo, designadamente quando, no contexto europeu, ele se arruma ao lado do “europeísmo mais extremo” do Partido Popular Europeu. Governo e Rangel estão assim abancados num alucinado avião que preanuncia descolar mas, na realidade, não levanta voo porque o delírio não produz qualquer energia impulsora. Uma estranha crença espirita se instala, assim e neste acinzentado tempo, ao encarnar o desvario fundeado numa espécie de religiosidade que faz da pobreza e das desigualdades a sua dinâmica constituinte e do abandono e da incerteza a condição vital dos seus indizíveis proveitos. O baloiçar do sofrimento errante, mergulhado num mundo de dependências, mantém viva a missão purgadora dos seus residentes, destinando-lhes um colo assistencial ao sopro do seu messiânico e estoico arengar. Nesta liturgia político-religiosa, a aristocracia – dos dinheiros e das influências – procura amimalhar a relação com os seus humildes alentando a ilusão de uma proteção garantida nesta vida; outros, em amiganço com a ganância dos primeiros, prometem o amparo noutras e futuras vidas. Até quando aceitamos esta miserável comédia?